O telefone, súbito inimigo
Comunica:
Minha mãe
A estrada é um calvário.
Morreu mais uma vez ontem
mais uma vez o leito, o protocolo
a espera
A cada hora uma martelada.
Mais uma vez hoje.
A falta, a saudade, a palavra
Paciente previamente hígida
Acidente Vascular Cerebral
E um silêncio estúpido
Porque não há o que
domingo, 25 de outubro de 2015
sexta-feira, 14 de agosto de 2015
2005
Amparada à minha mão que treme,mais parece que a sua está dormindo.
Serve a nada o anel que agora veste
Vem da alma esse brilho reluzindo.
Em meu olhar insistem em ler contas
Direitos e saberes tão honrados
Vício inútil recriminar a minha roupa
Minha pele é só teu corpo estampado
Julgando o que é essência racional
Concluem que te aceito e tu me abrigas
De nós se mostram cegos, afinal
Na alma te suplico e me suplicas.
2005
Tarde em vigília
Em todos os cantos
Procuro teu rastro
Ando na rua
Onde esteve um dia
A sua mirada
Volto sozinho
De novo criança
Contrariado
Em minha cama
Teu nome maldigo
Entre soluços
Desamparado
refaço os passos
de minha jornada
Em tua rua
Apenas lembrança
Em vão a espera
Montaste guarda
Toda a tarde
Em minha janela
1999
Às dez me chegou uma carta.
Dizia a mim: Morres amanhã.
Engraçado que não revoltei.
Desesperei-me em saber:
- O que fazer até a hora?
Pensei em lhe ver. Pensava assim Enquanto estava ao seu lado. Engano.
Atinei para a possibilidade de fugir. Impossível. Para amanhã o mais longe que posso ir é na esquina.
Talvez não haja nada a fazer.
São doze e já não sei.
O que faço até amanhã?
Sem dúvida que morro aos poucos. O faço sempre.
Vou cantar. Passarei as minhas horas cantando. Que sentido?
Mesmo nenhum. Que sentido faz uma sentença por carta?
Cantarei até amanhã, depois morro.
1998
Vim aqui para te fazer um poema,
Um poema como o gôsto do que sinto.
Mas não adiantam as mesmas rimas,
Acredito que não queres mais meu verso.
Acredito também que não adianta,
Não muda nada dizer que te amo.
Porque, das coisas que faço,
Do íntimo universo das coisas que faço,
Meu coração grita pelo teu,
E não te importa que eu seja só.
O que desejas,
Por mais que digas que não,
É gozar desse sentimento,
Saber que querem a tua presença.
Mas, meu bem,
E se ficares também sozinha,
Só, Sola,
O que pretendes fazer?
Eu vim aqui para te fazer um verso,
Um verso com gôsto de carinho.
Quero ir ao mais longínquo porto de tua alma,
Só para dizer que te amo.
A mim, me parece que o dia dará em chuvoso.
[Antes que o sol caia, na tarde de hoje]
2001
Antes que o sol caia, na tarde de hoje, eu devo lhe dizer: eu lhe amo. Devo dizer isso, não sem antes titubear, pensar em desistir e pensar que você não irá ligar a mínima, Essa opção eu não descarto, mas tenho de dizer assim mesmo. Antes disso, de dizer, eu devo lhe perguntar o que há no seu coração que poderá me pôr fora dele. Devo lhe dizer o quanto tenho sofrido desde aquele dia, aquele da tarde. Devo lhe dizer coisas que observo diariamente, os castelos e as masmorras do meu caminho. Lhe falar sobre o meu riso e o meu silêncio, as coisas as canções, as palavras, os sons. O que há de belo e de novo. Antes que o Sol se ponha, hoje, eu devo lhe falar sobre o pulsar mudo dos corpos, sobre a incandescência da vida e o brilho de cada pessoa. Antes de o Sol se pôr, esta tarde, você irá conhecer o universo mais puro, o meu mundo encantado, o meu espaço imaculado. Deverá saber porque é que amo os seus suspiros, porque é que amo os seus passos. Você deverá saber, antes de tudo, que o maior amor do mundo, o amor mais puro e mais vivo, esse amor é seu. Sem qualquer poesia, sem qualquer rodeio, você vai saber que é real. Antes que o Sol possa se pôr esta tarde, eu devo lhe dizer quanto amor, quanto amor, quanto amor... Eu poderei não dizer, poderei não conduzir o pensamento, poderei não conseguir pronunciar, e , principalmente, poderei não lhe convencer. nesse caso, nesse último caso, antes do Sol se pôr, eu estarei derrotado, totalmente. É certo que isso não importará lá essas coisas, não lhe dirá respeito. Ato contínuo, será o ponto final. Nesse ponto, bella donna, eu paro. Antes de o Sol se pôr, esta tarde, você irá saber: eu lhe amo.
[P.S: suponhamos que seja um poema-carta meta-verídico e que este poeta tenha engasgado antes das quatro da tarde irremediavelmente.]
Canção do Amor Dormindo
Outubro, 2000
Tua porta fechada - Disseram
Eu nem pude acreditar.
A chuva caindo seca,
sua rua tão pequenina...
Lembrei um samba qualquer,
cantarolando nas poças vazias
vazio o meu coração.
Desci inerte a ladeira
Quanta angústica, meu Deus...
Eu vindo, vindo...
Escrevo aqui essa canção,
tão triste, sem nota alguma,
Para ninar o seu silêncio,
Para dançar de mãos dadas,
Para imitar você dormir
Continua seu sono,
menina,
continua seu sono.
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